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A água

Antes de começar a sua leitura, tenha em mente que este texto não é um texto de autoajuda. E que palavra feia essa nossa amiga, a autoajuda. Na nova ortografia ela simplesmente tirou férias da beleza. Parece, e muito, que a barra de espaço quebrou. Enfim:

Começou a chover e Lucas foi imediatamente olhar pela janela de sua casa. Uma janela ampla, no segundo andar do sobrado, que dava vista para a rua e mais algumas coisas por lá. O barulho e a visão da água faziam com que o rapaz se acalmasse e esquecesse todos os problemas que tinha na vida. Lucas tinha muito o que esquecer.

No mesmo ano, sua mãe, já velhinha, faleceu. Entre outros tantos acontecimentos que a água levou. Água esta que Lucas olhava escorrer pela calçada, junto de um rapaz apressado sem guarda-chuva. Palavra esta com o seu hífen, bonitinho.

Lucas queria ser como a água. Adaptar-se aos locais variados e tomar a sua forma. Simplesmente mudar de local ao ser atingido e fingir que nada aconteceu. Lavar o corpo da Lurdinha. Entre outras tantas qualidades do líquido que dá a vida.

O telefone toca.

– Alô? – Atende prontamente o rapaz, visto que o telefone ficava ao lado da janela onde ele estava.

– Alô. Aí é da fabrica de panetone?

– Não.

– Então por que eu estou falando com uma frutinha?

Era só mais um trote. Lucas desligou o telefone e voltou a olhar pela janela. A chuva parara e ele desceu para ver um possível arco-íris. Estava realmente feliz, sabia que era uma palavra escrita com hífen e esteticamente decente. Mas ele não estava lá. No seu lugar, viu uma nuvem em forma de coelho. Achou a imagem muito bonita e tirou uma foto com o seu celular. Voltou para dentro de casa.

Naquela noite, respirou fundo e se deitou. Não estava chovendo, mas sonhou com um panetone molhado.

O que Lucas poderia tirar de um dia como este? Não sei. Não foi um texto de autoajuda. Na verdade, eu nem queria escrever essa palavra feia.

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