Bater na madeira quando se fala alguma coisa que possa ser ruim. Normal, não? Mas se precisar bater na madeira setenta e três vezes e dar uma voltinha, pulando em um pé só, não é tão normal. Transtorno obsessivo compulsivo, o famoso TOC, está na vida de muitas pessoas. De vez em quando na vida dos amigos e cônjuges também.
– Amor, apaga a luz e vem pra cama? – Diz a mulher, de camisola e voz sensual, pronta para o abate conjugal.
– Lógico meu xuxu. Vou lá.
Quinze minutos depois, ela está tomando café na cozinha, enquanto ele continua acendendo e apagando a luz.
– Trezentos e quarenta e nove, trezentos e cinquenta…, amor, me traz outra lâmpada? Essa também queimou.
Também pode atrapalhar no serviço, principalmente em um local que necessite de muita velocidade no atendimento.
– Próximo! – Diz o caixa do banco para a fila.
– Oi meu senhor. Que fila grande né? Vim depositar minha aposentadoria.
– Tudo bem minha senhora. Pode me passar o dinheiro?
– Está aqui. Tudo o que tenho. Sabe como é, ganhamos pouco.
– Entendo. Só um minuto.
E o caixa começa a passar as notas no calcanhar, uma-a-uma, esfregando ali perto do pé e cheirando depois. É um ritual do sul da África Central. Dá mais dinheiro na sua vida, dizia o livro que comprara há quinze anos atrás. Repetia o ritual sempre que pegava em uma nota.
Depois de trinta e cinco minutos, ele finalmente depositou o dinheiro da senhora e liberou a fila, furiosa e gigantesca.
Foi aposentado pelo INSS e internado em uma clínica de recuperação.
Grandes amizades podem se perder por causa de algo parecido. Nunca se sabe.
Amigos de longa data se encontram. Não se viam desde os quinze anos e estavam agora com quarenta. Um está saindo de casa, o outro chegando para visitar. Se encontram no portão.
– Lauro?
– Raphael?
– Há quanto tempo rapaz! Recebeu meu e-mail então?
– Lógico! Estou aqui, em carne e osso! Vamos tirar o atraso e conversar.
– Vamos, vamos. Faço o que ia fazer depois. Entre.
Mas quando o anfitrião abre a porta e dá passagem para seu grande amigo de adolescência, a conversa começa.
– Não, não. Pode entrar primeiro, o que é isso!
– Mas estou dando passagem, relaxa! Pode entrar!
– Então fecha a porta primeiro.
– Por que?
– Vamos começar novamente. Deixe eu abrir a porta.
– Tudo bem – Disse o amigo, se afastando da porta, com certo receio.
– Só espere um instante.
E começa a bater na porta, no ritmo de um salsa desconhecida. Quando termina a música completa, desabafa:
– Errei no terceiro refrão. Tenho que fazer novamente. Posso?
– Er, lógico. A porta é toda sua.
Depois de algumas tentativas, resolvem se despedir. Não iria dar certo e já tinham se estranhado depois da décima tentativa sonora.
Logo após Lauro ir embora, Raphael entrou em casa. Não sem antes limpar o pé oito vezes no capacho, sem interrupções e com o dedo mindinho do pé direito dobrado.
É realmente complicado lidar com isso, ainda mais quando é uma pessoa que você tem muito carinho e amor. Todos temos manias, mas algumas podem passar do limite e atrapalhar a vida dos outros. Quem gosta de verdade, consegue se acostumar com elas e até ajudar a superar, com carinho a paciência.
O autor de crônicas desse blog não tem muitos vícios nem manias hoje em dia. Já tive algumas bem engraçadas quando pequeno mas não convém falar delas em um local com tanta exposição.
Hoje em dia, tenho a mania de bater aleatoriamente no teclado quando estou com preguiça de digitar. Quando faço isso, deleto o que “escrevi” e digito o que era pra ser o texto original, para não me acharem um louco.
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Nessa crônica eu posso ter preguiça, bater no teclado e deixar aí a deleite do leitor.
É justificável.